O nome deste país vai ficar como símbolo de um heroísmo e desejo de paz que não se via há anos no mundo.
No grupo familiar, trocávamos informações acerca de manifestações de apoio à Ucrânia, e uma sobrinha minha, que trabalha na Polônia, escreveu:
— «Nós vamos hoje com os ucranianos do escritório. É impressionante o movimento gigante que se está a gerar. Penso que aqui a atmosfera seja mais intensa por haver tantos imigrantes ucranianos e pela proximidade geográfica. Imensas pessoas (jovens, velhos, polacos, ucranianos, russos, de todas as nações) estão a ir de carro até a fronteira polaca para ir buscar os refugiados e dar-lhes carona para os centros de refugiados, para outras cidades ou, várias vezes, para as suas próprias casas. Os protestos são cada vez maiores. Há filas nos “collection points” para entregar comida, medicamentos, roupa, etc., que estão a ser levados de comboio para a fronteira e a ser passados para a Ucrânia. É mesmo muito impressionante ver um país e uma sociedade, que não acolhe nada bem refugiados, nem imigrantes em geral, de repente, unir-se toda, nesta situação. Sente-se um ambiente de cortar à faca, mas ao mesmo tempo de união incrível nas ruas. É muito emocionante ouvir as histórias dos pais e das famílias do escritório. Uns ligam a chorar porque têm pais médicos que foram chamados para ir ajudar na linha da frente, outros criam associações do nada, porque a irmã está a dormir num “underground shelter”, porque está a ser bombardeada. De repente, gerou-se mesmo uma onda de considerar que todos temos os nossos pais lá e todos queremos ajudar».
Um amigo enviou-me da Polônia um vídeo interminável, filmado com o celular: uma fila imensa, que dobrava uma esquina e outra esquina e continuava… até um local para dar sangue, para enviar para a Ucrânia.
Outro amigo, contou-me um telefonema a que assistiu, de um polaco para um colega ucraniano, que trabalha na delegação da empresa na Ucrânia:
— Tens de fugir daí, vem cá para casa.
— Não posso, os meus pais estão aqui na Ucrânia…
— Então vamos aí buscá-los e trazê-los cá, para casa.
Mal começou a invasão, o Papa Francisco falou ao telefone com o Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenskyi, para o apoiar, e deslocou-se pessoalmente à Embaixada da Rússia perante a Santa Sé, para transmitir ao Embaixador, num encontro que durou 30 minutos, a sua posição perante o conflito. Telefonou também aos bispos ucranianos manifestando-lhes a disponibilidade para o que pudesse fazer pela Ucrânia. Nas redes sociais e nas audiências não se tem cansado de pedir a paz. Em particular, quis que Quarta-feira de Cinzas fosse um dia de jejum e oração pela paz na Ucrânia: «Jesus ensinou-nos que à insensatez diabólica da violência se responde com as armas de Deus, a oração e o jejum».
Os ucranianos são, em sua maioria, ortodoxos, ligados ao Patriarcado de Constantinopla, mas existe uma minoria ligada ao Patriarcado de Moscou. O Metropolita Onuphre, chefe dessa minoria, em vez de apoiar o argumento de Putin, de que intervinha para os proteger, declarou o seu apoio «aos militares que protegem e defendem a nossa terra e o nosso povo. Que Deus os abençoe e os guarde! Defendendo a soberania e a integridade da Ucrânia, dirigimo-nos ao Presidente da Rússia e pedimos-lhe que acabe imediatamente com esta guerra fratricida (…). Esta guerra não tem justificação nem perante Deus, nem perante os homens».
Um grupo de 233 padres e diáconos ortodoxos russos assinou um apelo de enorme coragem: «Choramos o calvário que aflige injustamente os nossos irmãos e irmãs da Ucrânia». E acrescentam que o Juízo Universal chegará para todos, avisando que: «nenhuma autoridade terrena (…), nenhuma guarda nos vai proteger deste juízo. Preocupados pela salvação de todos os que se consideram filhos da igreja ortodoxa russa, não queremos que nenhum deles chegue a este juízo carregando o fardo pesado da maldição materna».
Amigos meus, que falam russo e seguem o que por lá se passa, dão-me notícia de que alguns russos se manifestam pacificamente contra a guerra e são brutalmente reprimidos. Há também russos que trabalham para sabotar a produção de armas.
— «Todos os Youtubers russos que nós seguimos, dos temas mais variados (canais sobre a Ucrânia, sobre carros, a minha Youtuber preferida sobre minimalismo) arriscaram a vida para criticar publicamente a invasão. Esses canais transformaram-se em meios de reportagem de guerra ou de ativismo político. Outro Youtuber muito influente na opinião pública, (…) teve de fugir para a Noruega».
A ONU e a União Europeia condenaram com veemência a crueldade russa.
Depois desta invasão, o mundo está talvez mais solidário, mais unido, mas milhares de ucranianos estão a pagar com a vida o preço deste resultado.
José Maria C.S. André
Fonte: https://spedeus.blogspot.com/
04 de março de 2022