Entrevista com o cardeal Ratzinger
L’Avvenire: Há muitos anos, o senhor falava em termos proféticos sobre a Igreja do futuro: a Igreja – dizia então – reduzir-se-á nas suas dimensões, e será preciso começar novamente. Mas desta prova sairá uma Igreja que terá obtido uma grande força do processo de simplificação pelo qual terá passado, da sua renovada capacidade de olhar para dentro de si mesma. Qual é a perspectiva que nos espera na Europa?
Cardeal Ratzinger: “Para começar, a Igreja “reduzir-se-á numericamente”. Quando fiz esta afirmação, choveram-me de toda a parte censuras de pessimismo. Hoje, quando todas as proibições parecem ter caído em desuso, entre elas as que dizem respeito ao que se vem chamando pessimismo – o qual, com frequência, não passa de um sadio realismo -, cada vez são mais os que admitem que a percentagem dos cristãos batizados na Europa vem diminuindo: numa cidade como Magdeburgo, é de apenas 8% da população total, incluindo-se aí todas as confissões cristãs. Os dados estatísticos mostram tendências irrefutáveis. Neste sentido, reduz-se a possibilidade de identificação entre povo e Igreja em determinadas áreas culturais. Devemos tomar nota disto com simplicidade e realismo.
A Igreja de massas pode ser algo muito bonito, mas não é necessariamente a única modalidade do ser Igreja. A Igreja dos primeiros três séculos era pequena, sem que por isso fosse uma comunidade sectária. Pelo contrário, não estava fechada sobre si mesma, mas sentia uma grande responsabilidade pelos pobres, pelos doentes, por todos. No seu seio encontravam abrigo todos aqueles que se nutriam de uma fé monoteísta e estavam à busca de uma promessa. Essa consciência de não ser um clube fechado, mas de estar aberta à comunidade no seu conjunto, sempre foi um componente intrínseco da Igreja.
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Devemos tomar nota da diminuição das nossas fileiras, mas devemos continuar igualmente a ser uma Igreja aberta. A Igreja não pode ser um grupo fechado, auto-suficiente.
Devemos, sobretudo, ser missionários, no sentido de voltar a propor à sociedade aqueles valores que são os fundamentos da forma legal que a sociedade deu a si mesma, e que estão na base da própria possibilidade de construir qualquer comunidade social verdadeiramente humana. A Igreja continuará a propor os grandes valores humanos universais. Porque, se o Direito deixa de ter fundamentos morais compartilhados por todos, desmorona também como Direito. Deste ponto de vista, a Igreja tem uma responsabilidade universal. Responsabilidade missionária significa precisamente, como diz o Papa, empreender verdadeiramente uma nova evangelização.
Não podemos aceitar tranquilamente que o resto da Humanidade volte a precipitar-se no paganismo; devemos encontrar o caminho para levar o Evangelho também aos não crentes.
A Igreja deve recorrer a toda a sua criatividade para fazer com que não se apague a força viva do Evangelho.
(Cardeal Joseph Ratzinger in ‘Dios y el mundo’; repr. no ‘Avvenire’ de 27.09.2001)
Nota: o destaque é do site claravalcister.com