Nas últimas semanas postei vários artigos sobre a crise da Igreja. Hoje volto ao assunto. Primeiro, pela postagem do artigo sobre o sonho de S. João Bosco sobre as duas colunas. Segundo, pela reprodução de trecho de entrevista de Dom Fernando Ocáriz a Rafael Serrano em que a questão é abordada. (1) Curiosamente, uma pergunta feita na época (imagino que há aproximadamente 10 anos) toca em um ponto que voltou à evidência em nossos dias: abusos cometidos por membros do clero. Por outro lado vejam como o remédio proposto por D. Fernando coincide com o que é dito no sonho de D. Bosco. (V.O.)
Rafael Serrano: “Outra fonte de má fama para a Igreja são os “assuntos internos”: abusos de menores por padres, a falta de transparência nas finanças do Vaticano, “os vatileaks” (2). Parece que sobram roupas sujas. Essa percepção corresponde à realidade? Aí está a causa para a repulsa crescente pela Igreja em amplos setores da sociedade?
D. Fernando: “ Essa percepção, em alguns casos, não em todos, corresponde à realidade de acontecimentos deploráveis, mas que foram trazidos à tona como se eles representassem a realidade atual da Igreja, quando se deve dizer – sem subestimar a sua gravidade – que representam fenômenos estatisticamente marginais e (3), infelizmente, são muito mais frequentes em outras realidade sociais. Isso não modifica em nada que cada um desses abusos seja intolerável, e requeira compaixão e ajuda às vítimas, além das medidas disciplinares apropriadas” (4)
Nesse momento D. Fernando acentua aspectos positivos na renovação católica na época:
“Por outro lado, não me parece exato afirmar que ocorra uma repulsa crescente pela Igreja em amplos setores sociais, sem reconhecer ao mesmo tempo que, em outros amplos setores, a Igreja representa o principal ponto de referência moral. Além disso, embora haja uma crise de fé em muitos cristãos, também existem elementos de renovação eclesial em países como a Holanda, por exemplo, onde a vitalidade dos católicos está experimentando um significativo crescimento após anos de profunda crise”.
FS: Não houve crise apenas na Holanda. Certamente há boas notícias de outros países, mas o senhor acha que acabou a crise na Igreja? Como qualifica a situação atual?
Dom Fernando: Sempre há aqueles que consideram a situação atual de forma positiva e aqueles que a veem tremendamente tenebrosa. Não há crise naquilo que, na vida da Igreja, depende apenas de Deus; neste sentido, a Igreja é e será sempre santa e indefectível. No entanto, naquilo que também depende da correspondência humana, embora haja realidades muito positivas, heroísmos e santidade entre os cristãos, a situação global é, em minha opinião, muito preocupante. Paulo VI chegou a lamentar que a fumaça de Satanás estava entrando pelas frestas da Igreja. Muito mais recentemente o Cardeal Ratzinger, na sua famosa Via Crucis de 2005, denunciava quanta sujeira há na Igreja, sobretudo entre aqueles que deveriam ser os seus mais responsáveis guardiões.
A seguir, depois de falar da necessidade de combater a languidez espiritual e a ignorância doutrinária ele conclui de modo que nos faz lembrar o sonho de D. Bosco sobre as duas colunas:
“Quanto à atual crise na piedade, sem pretender generalizações injustas, penso que uma chave principal está no mau trato que se dá à Eucaristia, e isso vem de longe. Anos atrás, João Paulo II, na carta Dominicae Cenae (n.12), pediu publicamente a Deus pelos graves e difundidos maus tratos que recebe o Senhor na Eucaristia; e como acabei de mencionar também o fazia aquela Via Crucis do cardeal Ratzinger poucas semanas antes de ser eleito sucessor de Pedro. Enquanto não seja recuperado de modo geral o sentido sacro da celebração do Sacrifício Eucarístico, da adoração crente e amante diante da presença real de Jesus na Hóstia Santa, a crise na Igreja não poderá ser superada.
Notas:
1. OCÁRIZ, Fernando. Sobre Deus, a Igreja e o mundo, entrevista a Rafael Serrano. São Paulo, Quadrante, 2013, p. 67-69.
2. Vatileaks foi o nome dado ao roubo e vazamento de documentos reservados do Papa Bento XVI. Entre outros tivemos uma carta do núncio papal nos EUA, Carlo Maria Viganó, que denunciava a ‘corrupção, prevaricação e má gestão’ na administração vaticana.
3. Como sabemos as atuais denúncias sobre questões morais contra membros do clero em vários países mudam radicalmente o que D. Fernando observava na época.
4. A maior revolta dos fiéis católicos americanos em relação à hierarquia é exatamente quanto a esse ponto. Muito pouco foi feito em relação à punição dos responsáveis por inúmeros abusos envolvendo pedofilia e homossexualismo.
D. Fernando Ocáriz é o atual Prelado do Opus Dei.
Os destaque em negrito são do site claravalcister.com