A palavra “conservador” te atrai ou provoca reações negativas? Se fosse “rotulado” de conservador, qual seria a sua primeira reação? Tem dúvida? Veja o que diz a respeito o prof. Rodrigo Coppe Caldeira – (…) “Certo é que, mesmo no âmbito político, não existem aqueles que se declaram expressamente como “conservadores”, pois, como dito acima, na conjuntura política e cultural brasileira isso é “palavrão” (1).
Palavrão ou não o certo é que o conservadorismo – o político e o religioso- tem crescido no mundo e no Brasil. Continua um palavrão? Coisa de reacionários egoístas? Na pena da esquerda sim. Contudo, se formos olhar o que seria realmente esse conservadorismo entenderemos melhor porque passa a ser defendido com mais consistência e altaneria (2).
O presente artigo tem por objetivo apresentar o conservadorismo dentro da Igreja.
Em geral considera-se que conservadorismo católico significa a adesão a uma série de princípios doutrinários e a uma mentalidade que, na verdade, deveriam ser considerados como aceitos e praticados por todos os católicos, tais como:
A aceitação de que Cristo criou uma Igreja visível, una, santa, católica, apostólica dotada de uma hierarquia que tem entre seus objetivos manter íntegra a Revelação bem como ensinar, santificar, governar. Tudo para a maior glória de Deus. Na linguagem antiga dizia-se que há uma Igreja docente – o Papa e os bispos em comunhão com ele – todos sucessores dos apóstolos, e uma Igreja discente, os leigos. Hoje esta distinção é mantida, mas enfatiza-se bem mais o papel dos leigos através do chamado sacerdócio comum.
A Igreja, contudo, é muito mais que uma instituição jurídica. Ela é o próprio Corpo de Cristo, um corpo tão especial que deve ter um nome especial: O Corpo Místico de Cristo. Cristo é a Cabeça do Corpo; cada batizado é uma parte viva, um membro desse Corpo, cuja alma é o Espírito Santo” (3). Ademais, (…) o Corpo da Igreja de Cristo, tal como Ele a criou: não (é) uma mera irmandade invisível de homens unidos pela graça, mas uma sociedade visível de homens subordinada a uma cabeça investida em autoridade e governo. É o que chamamos uma sociedade hierárquica, com as sólidas e admiráveis proporções de uma pirâmide” (4).
Na ponta da hierarquia está o Papa, representante de Cristo na terra. Logo, merece um respeito especial. Atos de deferência referem-se ao cargo por ele exercido e não à pessoa do Papa. E é justamente por este motivo que o conservador amará e rezará pelo Santo Padre, seja ele quem for. É o sumo pontífice quem tem a incumbência de manter a fé de seus irmãos bispos e de cada um de nós. É ele que, como ensina o Concílio Vaticano I, quando ensina ex-catedra, em matéria de fé e moral, tem o dom da infalibilidade. Dom que dá aos fiéis a certeza sobre o que deve ser crido.
O católico também acredita que as grandes verdades da fé têm sua fonte na revelação. Desta recebemos as verdades que são de Deus, “eternamente imutáveis, as mesmas para todos os povos (5). Nessa lógica de que há verdades que não mudam, diz a moral católica que, há atos humanos que são maus em si mesmos, que jamais dependem de circunstâncias. Eles são tidos como, intrinsecamente, maus. É o caso do assassinato voluntário do inocente e dos atos contra a natureza.
Acrescentemos a isso outras características do católico considerado conservador: o senso de disciplina e o amor à ordem, o combate ao pecado, mesmo o venial, a rejeição da heresia, o espírito de mortificação e o amor à cruz, a espiritualidade mariana, a devoção aos santos, o senso do sagrado na liturgia, a preocupação com a salvação da própria alma em conexão com a caridade para com todos os homens.
No campo temporal empenha-se na defesa dos valores familiares e da própria família, tida como esteio da sociedade. Também rejeita todos os totalitarismos e defende com amor a liberdade, o que inclui, em consonância com os ensinamentos da Igreja, a diversidade de opções legítimas face à política.
Importante notar que tal conservadorismo não tem nada a ver com sua caricatura tal como apresentada pela mídia de esquerda ou por católicos que, por várias razões, insistem em considerar a parte como o todo. No caso quando atribuem as posturas políticas de certos católicos a toda a categoria de conservadores. É o que vemos no artigo “As novas (velhas) faces do conservadorismo” (6).
Conservadores e tradicionalistas
Tendo em vista as colocações feitas acima podemos nos perguntar se o chamado católico conservador não defende o mesmo que o tradicionalista.
A resposta é: não. Exatamente porque o católico conservador acredita e afirma que sempre procura estar afinado com os ensinamentos dos Papas, incluindo todos os últimos. E, obviamente, não estamos falando em opiniões pessoais deles dadas informalmente, mas em documentos oficiais que, por sua natureza, implicam em plena adesão dos fiéis.
Assim sendo ele passou a ser tido – e assim se considera – como um católico que procura a continuidade entre os ensinamentos de sempre com o ensinamento e o verdadeiro espírito do Concílio Vaticano II. Não são cegos face à crise da Igreja – se bem que possa haver ingenuidade em muitos deles – mas, não a atribuem ao Concílio em si mesmo. Não acreditam que houve uma ruptura do Concílio com o magistério de sempre. Este tem de ser interpretado de acordo com a chamada hermenêutica da continuidade.
Quem são os conservadores na Igreja?
Advirtamos, em primeiro lugar, que há católicos conservadores que não gostam do título, ou do rótulo. De um lado porque certas instituições não obrigam seus fiéis a terem uma determinada posição política, por exemplo, e de outro porque sentem desagrado em ver uma visão religiosa associada a ideologias políticas de qualquer coloração. Ademais, não fazem apostolado em nome do conservadorismo.
Feita essa ressalva elencamos alguns movimentos e instituições que são tidos por conservadores tais como: Os Legionários de Cristo, os Arautos do Evangelho, Comunhão e Libertação, o Opus Dei, Neo Catecumenato, o Movimento Carismático da Canção Nova, Human Life International e os vários movimentos pró-vida.
Entre nossos bispos são tidos como conservadores, por exemplo, D. Orani João Tempésta e outros da arquidiocese do RJ e D. Henrique Soares da Costa, da diocese de Palmares, recém falecido. Entre os padres muito atuantes podemos destacar o Padre Paulo Ricardo e o padre Luiz Carlos Lodi, do movimento Pró Vida de Anápolis.
Entre os leigos no passado Gustavo Corção, Lenildo Tabosa Pessoa, João Camilo de Oliveira Torres foram figuras de destaque. Atualmente, incluem-se o prof. Felipe Aquino – mais na linha essencialmente religiosa – e Percival Puggina, destacado líder católico gaúcho ligado ao liberalismo e ao conservadorismo político (7)
Na Europa e nos EUA temos uma plêiade de figuras da hierarquia que tem se destacado na crítica aos avanços da agenda progressista. Bom número, como o cardeal Sarah, que tem posturas firmes e coerentes diante da crise da Igreja, mas sem críticas ao Papa e na linha da hermenêutica da continuidade.
Dissidência entre conservadores?
Contudo, há já um certo tempo, uma parcela crescente de conservadores começou a se perguntar se não foram ingênuos em relação a certos pontos que defenderam no passado. O questionamento parece ter nascido do avanço dos progressistas. Estes teriam sido elevados pelo Papa Francisco a cargos proeminentes no Vaticano e na Igreja, gerando certo desconforto. Outro ponto seriam algumas atitudes, propostas e ideias do próprio Pontífice. Resultado: uma ala dos conservadores começou a resistir publicamente. Começaram, inclusive, a questionar se não é o caso de revermos o Concílio Vaticano II.
A dissidência é séria, muito séria. É ela mesma parte da crise? Cremos que sim. No horizonte plúmbeo parece que surgem novas tempestades (8).
NOTAS:
- Artigo in http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/45840-tradicionalismo-e-conservadorismo-catolicos-as-ideologias-em-jogo-entrevista-especial-com-rodrigo-coppe-caldeira
- É interessante também estudarmos as características do conservadorismo político. Nele podemos ver, também, porque não há porque associar o termo a obscurantismo ou algo vergonhoso. Veja no site olivereduc o artigo “Os 10 princípios do conservadorismo”+.
- TRESE, Leo. A Fé explicada. São Paulo: Quadrante, 1981. p. 117.
- Ibid. p. 115
- Ibid. p. 124
- https://domtotal.com/noticia/1247491/2018/04/as-novas-velhas-faces-do-conservadorismo-catolico/
- A lista é meramente ilustrativa e a fiz de memória. Agradeço se me fornecerem uma lista melhor e mais atualizada.
- Tema do próximo artigo aqui no claravalcister – “Os conservadores que questionam”
Prezada Sonia. Há sim certa confusão sobre tradicionalistas e conservadores católicos. No texto coloquei uma distinção que julgo importante: a questão do Vaticano II e da liturgia. Acrescentemos a isso que alguém pode ser favorável a várias tradições (culturais, institucionais, etc) e nem por isso é tradicionalista.
Na verdade poderíamos fazer uma série de distinções em relação a movimentos e instituições citados mas isso deixaria o texto muito longo e, provavelmente cansativo. É sempre bom lembrar o ditado francês: “A verdade está nos matizes”. Grato pela atenção.
Fiquei um pouco surpresa com algumas instituições consideradas, neste artigo, como conservadoras já que, a meu ver, poderiam ser incluídas no rol de tradicionalistas. Essa confusão é normal?