S. Bernardo enfrenta Guilherme X
Como vimos no artigo sobre o cisma anacletino, Guillherme, inicialmente, apoiou Anacleto. Após a intervenção de São Bernardo passou a apoiar Inocêncio. Durou pouco tempo. Recaiu. Voltou a apoiar o antipapa. Em 1134, o grande santo aproveitou uma oportunidade para tentar fazê-lo voltar ao bom caminho. O grande evento foi assim retratado por Ailbe Ludi:
(…) “Finalmente, o servo de Deus decidiu efetuar um derradeiro esforço para quebrar a obstinação do fidalgo. Convidou o duque a ir à igreja onde tencionava celebrar Missa pela sua conversão. Guilherme não se atreveu a recusar, embora, por se achar sob excomunhão, não pudesse transpor a entrada. O templo encontrava-se repleto de gente cujo instinto lhes dizia que algo de extraordinário estava em vias de suceder. No santuário ajoelharam-se os bispos de Chartres e Poitiers. Tudo decorreu como normalmente até ao momento da comunhão em que depois de conceder a “pax” aos presentes, o homem de Deus, não procedendo já como simples homem, pegou no corpo do Senhor, colocou-o na patena e, com o semblante iluminado e olhos chamejantes, levou-o para fora da igreja, não agora para suplicar mas para ordenar. Dirigindo-se ao duque Guilherme, com inflexão terrível, disse:
“Implorei-vos e desprezaste-me; supliquei uma segunda vez na presença de uma multidão de servidores de Deus e voltastes a desprezar-me e a eles. Contemplai o Filho da Virgem, o Chefe e Senhor da igreja que perseguis, que veio em pessoa encontrar-se convosco. Eis o vosso Juiz, ao som de cujo nome dobram todos os joelhos no céu, na terra e no inferno. Eis o vosso Juiz, ao som de cujo nome se dobram todos os joelhos no céu, na terra e no inferno. Eis o vosso Juiz em cujas mãos a vossa alma cairá um dia. Desprezá-lo-eis também? Repudiareis Cristo como repudiastes todos os seus servos?
Os assistentes permaneciam em redor, chorando e orando, numa agonia de incerteza, na expectativa de algo ignorado. Guilherme ao escutar estas palavras e vendo a hóstia na mão do abade sobre a patena, principiou a tremer, perdeu o domínio dos membros e prostrou-se no solo. Levantado por um dos seus guardas, voltou a tombar, gemendo roucamente, enquanto a saliva lhe brotava dos lábios. Não falava nem erguia o olhar, mas apresentava todo o aspecto de um ataque de epilepsia. Então, o homem de Deus acercando-se, tocou-lhe no pé com o seu e ordenou-lhe que se levantasse e escutasse o que o Senhor lhe determinava. Ele obedeceu em silêncio. “O bispo de Poitiers, que expulsastes da sua diocese, encontra-se aqui presente, (disse o abade). Acercai-vos dele e reconciliai-vos, dando-lhe o beijo da paz e conduzindo-o à sé de onde o afastastes. Restitui-lhe o reino de caridade e concórdia nos vossos domínios. Em seguida, deveis submeter-vos ao Papa Inocêncio e obedecer ao vigário de Cristo como fazem todos os outros cristãos”. Sem uma palavra, o duque caminhou para o bispo e deu-lhe o beijo da paz. Mais tarde, conduziu-o pela mão à catedral de Poitiers”
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Ailbe Ludi conclui: “Tal é a descrição do Abade Ernaldo acerca desta cena impressionante e sem paralelo”
O fim de Guilherme
Depois desse episódio impressionante Guilherme achava-se agora absolutamente convertido. Grato pela graça que lhe fora concedido, fundou no mesmo ano o mosteiro cisterciense de Grace-Dieu em Aunis, na diocese de La Rochelle, vindo a ser ocupado por monges de Claraval. Passou os dias que lhe restavam de vida no isolamento, tentando reparar com piedade e penitência as culpas do passado.
Sua conversão causou tanto impacto que surgiram lendas sobre seus últimos anos de vida que narram suas viagens na Palestina, na Itália e na França. Uma vida plena de penitência e de milagres.
Fontes:
1.Luddy, Ailbe J. São Bernardo de Claraval, trad. Eduardo Saló, Lisboa, Aster, s/d.
2. São Bernardo. https://www.wikiwand.com/pt/Bernardo_de_Claraval
