A FESTA DE SÃO NAPOLEÃO

José Maria C. S. André

No próximo dia 15 de Agosto, como todos os anos, celebra-se a grande solenidade da Assunção de Nossa Senhora ao Céu.

Como todos os anos? Bem, houve um tempo em que o Imperador dos franceses, Napoleão Bonaparte, substituiu a festa de Nossa Senhora. Passou a ser a festa de S. Napoleão… Que a Igreja nunca tivesse canonizado um Napoleão não era problema, porque entre as multidões de centuriões romanos que se converteram e estão no Céu, possivelmente algum se chamava Napoleão e, mais importante que um Napoleão no Céu era o Napoleão onipotente que governava a França e queria dominar o mundo. Parecia-lhe que quem mandava tanto neste mundo podia também mandar no outro mundo e a Igreja cabia sob a autoridade suprema do imperador.

Talleyrand

Napoleão nomeava bispos em França, dispunha dos padres e dos conventos, substituía a seu bel-prazer as celebrações católicas por festas de S. Napoleão, mas Deus ainda não era seu súdito e o Papa, seu representante na Terra, ainda lhe escapava. O magno desafio de subjugar a Igreja foi confiado a um profissional de invulgar habilidade, chamado Talleyrand.

A trajetória deste especialista é desconcertante. Como, apesar de ser nobre, não podia fazer carreira militar, porque tinha uma perna mais curta que a outra, decidiu em alternativa ser bispo. Naquela altura, em que os reis mandavam tanto, o plano era exequível e, de fato, o Rei nomeou-o. Pouco depois, o Rei reúne os Estados Gerais e Talleyrand entra na política ao lado do Rei. Como este estava falido, Talleyrand propõe nacionalizar os bens da Igreja. Com pouco mais de dois anos como bispo, a função deixa de lhe interessar e demite-se. Entretanto, abandona o Rei, refugia-se momentaneamente no estrangeiro durante a revolução e regressa como Ministro dos Negócios Estrangeiros do Diretório. Entretanto, começa a conspirar e organiza o golpe de Estado que acaba com o Diretório e prepara o consulado de Napoleão, que mantém Talleyrand como Ministro dos Negócios Estrangeiros e seu principal conselheiro. É nesta função que concebe o seu plano para subjugar a Igreja.

Papa Pio VI

O primeiro passo consistia em raptar o Papa Pio VI, escondê-lo em França e anunciar que tinha morrido. O segundo passo seria dar tempo para que um novo Papa fosse eleito e, depois, apresentar Pio VI afinal vivo. Confrontada com dois Papas em exercício, a Igreja dissolver-se-ia em lutas internas, Paris substituía o Vaticano e o Imperador substituía o Papa.

A primeira parte da operação, invadir Roma e raptar o Papa, foi fácil. Levá-lo para França correu menos bem porque as multidões desobedeciam ao Imperador e ajoelhavam-se à passagem do prisioneiro. Mas a parte do plano que correu pior foi que Pio VI não sobreviveu aos maus tratos e morreu antes de a Igreja ter escolhido o sucessor. Pior ainda, para marcar a continuidade, o Pontífice seguinte escolheu o nome de Pio VII.

Papa Pio VII

Preocupado com a situação da igreja em França, Pio VII cedeu em tudo o que não era essencial. Aceitou o confisco dos bens da Igreja e reconheceu o Governo francês em troca de alguma liberdade para a Igreja. Só não pôde aceitar o divórcio de Napoleão, nem o bloqueio econômico ao Reino Unido. Como as cedências não bastavam, o exército francês volta a invadir Roma e Pio VII é levado prisioneiro para França. Sujeitam-no a enormes pressões mas resiste e, quando a estrela de Napoleão começa a apagar-se, o Imperador desiste do plano e consente que o Papa regresse a Roma.

Talleyrand —que mudava de amantes a um ritmo que escandalizava o próprio Napoleão, que também não era fiel à sua mulher— depois de ter apoiado o Imperador, começa a conspirar contra ele. Cai Napoleão e Talleyrand é eleito para chefiar o Governo provisório e junta-se ao novo Rei Luís XVIII, de quem depois se afastou. Continuou assim a manter o poder e a trair, um a um, os seguintes que o nomearam.

Napoleão

No dia da morte, Talleyrand assina uma retratação por tudo o que tinha feito contra a Igreja e recebe a Unção dos Enfermos. E S. Napoleão? A Igreja ainda não canonizou nenhum Napoleão, mas o ex-Imperador Napoleão Bonaparte quis morrer «no seio da Igreja Apostólica e Romana». Pouco antes de morrer confessou-se ao Pe. Vignali, enviado do Papa; fez há poucos dias 200 anos.

Fonte: Spedeus.blogspot.com 06 de agosto de 2021.

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